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Implicações da insegurança jurídica nas regras trabalhistas superam R$ 9 bilhões, avalia estudo inédito
De acordo com um estudo inédito da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) a insegurança jurídica no campo trabalhista está entre os principais obstáculos a investimentos e geração de empregos de qualidade no Brasil.
De acordo com a FecomercioSP, esse cenário instável gera custos elevados tanto para as empresas quanto para o setor público, impactando também o preço de bens e serviços consumidos pelos trabalhadores.
Segundo estimativas do estudo, que analisou dez casos reais, o efeito direto nas despesas corporativas supera os R$9 bilhões*.
Essa incerteza jurídica surge de decisões que divergem e, por vezes, até contradizem a legislação vigente, gerando custos financeiros desproporcionais aos benefícios sociais, uma situação que tem se agravado no País. Como consequência, empresas que cumprem as leis são sobrecarregadas por custos adicionais diretamente relacionados à falta de segurança jurídica.
O estudo foi conduzido por José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações de Trabalho, em parceria com o Conselho Superior de Direito, presidido pelo jurista Ives Gandra Martins, ambos órgãos da Entidade.
Os dados foram analisados por grupo de trabalho multidisciplinar e apresentado durante evento conjunto dos conselhos ocorrido na última sexta-feira (8).
Com o apoio de ferramentas de jurimetria da Data Lawyer, o levantamento analisou o alcance e os custos desses dez casos, ilustrando como o “voluntarismo” judicial afeta o ambiente trabalhista no Brasil, gerando despesas significativas para as empresas, os trabalhadores e o Erário. “Aquilo que nós estudamos nessas situações, na verdade, se multiplica por outras centenas de milhares que existem no Brasil, em contextos em que as sentenças vão se afastando das leis e, às vezes, são até contra elas”, alertou Pastore durante o evento.
Confira, a seguir, os destaques do estudo.
O custo da gratuidade da Justiça do Trabalho
A Justiça do Trabalho concede isenção de custas processuais a 76% dos reclamantes que solicitam esse benefício, mesmo em caso de abundância de recursos financeiros desses indivíduos, o que não justifica a gratuidade.
Com essa prática, a despesa das custas processuais é transferida para o Erário, totalizando mais de R$ 1,1 bilhão nos últimos cinco anos. Além disso, o pagamento de peritos absorve anualmente cerca de R$ 100 milhões das verbas públicas. Desde a decisão da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.766, em 2021, houve um novo aumento de ações, o que tem elevado ainda mais os gastos públicos.
Vale lembrar que essa ADI, julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), abordou a constitucionalidade das novas regras para a gratuidade de justiça, entre outros pontos da Reforma Trabalhista de 2017.
O custo da desconsideração de Norma Regulamentadora (NR)
Em dezembro de 2014, o STF estabeleceu uma tese vinculante no sentido de que o direito à aposentadoria especial decorre da efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, vinculando assim, outros julgamentos de mesma natureza, por força do Tema 555, tendo, ao mesmo tempo, estabelecido presunção da incapacidade de eliminação de ruídos pelo uso de protetores auriculares.
Com isso, passou-se a exigir das empresas o pagamento de alíquota adicional para a aposentadoria especial, obrigação de natureza previdenciária, incidente sobre a folha de pagamento dos empregados expostos aos agentes nocivos, com alíquotas de 6%, 9% ou 12% (§ 6º do art. 57 da Lei 8.213/91), inclusive de forma retroativa. Ocorre que diversas decisões da Justiça do Trabalho adotaram essa mesma presunção sobre a ineficácia dos protetores auriculares, passando a conceder adicional de insalubridade e a penalizar o descumprimento dessa obrigação.
Nos últimos cinco anos, foram registradas mais de 500 ações desse tipo na Justiça do Trabalho e mais de 27 mil na Justiça Federal, totalizando cerca de R$ 3,5 bilhões em disputas judiciais. Considerando, de forma conservadora, um índice de condenação em torno de 50%, os custos gerados pela controversa decisão do Supremo ultrapassaram R$ 1,7 bilhão no período.
O custo financeiro das interpretações da Reforma Trabalhista
A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) passou a regulamentar as relações de emprego com efeitos imediatos, incluindo o fim do pagamento das horas in itinere. O termo refere-se ao tempo que o trabalhador gasta em deslocamento entre a própria residência e o local de trabalho.
Contudo, ainda que a questão já esteja estabelecida em lei, tramita no Tribunal Superior do Trabalho (TST) um Incidente de Resolução de Recursos Repetitivos, para responder à seguinte questão: as empresas terão de continuar pagando direitos antigos para contratos em andamento, ou poderão se ajustar totalmente à nova legislação para todos os trabalhadores, até mesmo para contratos antigos?
A decisão do Pleno do TST pode expor as companhias a um grande passivo trabalhista. Nos últimos cinco anos, mais de 9 mil ações foram ajuizadas nessa área, somando um valor superior a R$ 1,4 bilhão. Uma indústria com cem empregados, por exemplo, pode ser obrigada a arcar com mais R$ 1,2 milhão por ano apenas para o pagamento dessas horas. Mais preocupante do que o montante em si é o precedente que essa decisão poderá criar, permitindo a extensão desse critério para outras regras da Reforma Trabalhista.
O custo da generalização da periculosidade
Segundo decisão da Justiça do Trabalho, em decorrência do armazenamento de líquido inflamável usado pelo gerador de energia, o adicional de periculosidade é devido ao reclamante, uma vez que todo o espaço interno de um edifício de vários andares foi considerado como área de risco.
Essa decisão foi tomada a despeito de a NR 16 restringir a periculosidade apenas aos trabalhadores que entram efetivamente na bacia de contenção dos tanques de inflamáveis. Uma empresa de grande porte, ocupando vários andares com pessoal administrativo, foi obrigada a reservar mais de R$ 100 milhões anuais para cobrir o risco imposto pela sentença judicial. Nos últimos cinco anos, mais de 3 mil ações semelhantes foram movidas, afetando diversas empresas.
O custo da desconsideração da terceirização
Embora as leis da Reforma Trabalhista e da Terceirização (13.429/2017) tenham autorizado e regulamentado a prática para qualquer atividade, muitas decisões judiciais ainda anulam contratos de terceirização em atividades-fim. Nos últimos cinco anos, foram mais de 40 mil ações desse tipo, totalizando mais de R$ 7 bilhões em disputas judiciais. Mesmo com uma estimativa conservadora, em que 20% dessas ações sejam julgadas procedentes, as empresas lidariam com despesas superiores a R$ 1,4 bilhão nesse período. Vale lembrar que, em 2020, o próprio STF reconheceu a constitucionalidade da lei.
O custo da desconsideração do banco de horas
Muitos julgados têm desconsiderado o banco de horas estabelecido regularmente por negociação coletiva. No setor de atendimento domiciliar (home care), isso resultou em cerca de 22 mil ações nos últimos cinco anos, com um valor estimado em quase R$ 2,5 bilhões.
Mesmo frente a um cálculo conservador, essas decisões geraram um aumento de cerca de R$ 500 milhões em despesas para as famílias dos pacientes no período analisado. Além disso, há custos adicionais para as empresas desse ramo e para o Erário, já que algumas famílias recorrem ao Sistema Único de Saúde (SUS) por não conseguirem arcar com o tratamento domiciliar.
O custo da desconsideração da prevalência do negociado
A resistência de diversos magistrados à prevalência do negociado sobre o legislado tem levado à anulação de acordos e convenções coletivas. Uma empresa, por exemplo, foi obrigada a desembolsar R$ 5,3 milhões para atender a sentenças de 92 ações trabalhistas desse tipo.
Só nos últimos cinco anos, foram registradas mais de 25 mil ações dessa natureza, com valores totais de R$ 3,96 bilhões e custos efetivos estimados para as empresas de quase R$ 1,2 bilhão. “A espinha dorsal da Reforma Trabalhista foi o prestígio da negociação coletiva. E essa base é enfraquecida por decisões da Justiça do Trabalho, contrárias até mesmo à orientação da Suprema Corte”, advertiu o ministro Gandra Martins Filho, do TST.
O custo do ‘limbo previdenciário’
Muitas empresas estão sendo condenadas a pagar salários, benefícios e encargos a empregados licenciados que foram considerados aptos para o trabalho pelos médicos do INSS, mas inaptos pelos médicos das próprias empresas. Esses pagamentos retroativos incluem juros e correção monetária. Nos últimos cinco anos, ocorreram aproximadamente 18 mil ações do tipo, totalizando mais de R$ 2,4 bilhões e resultando em uma despesa de cerca de R$ 490 milhões para as empresas.
A importância da redução das imprecisões legais e do equilíbrio entre direitos e custos
O Conselho de Emprego e Relações de Trabalho da FecomercioSP destaca ser essencial que os poderes públicos atuem para minimizar e, se possível, eliminar as imprecisões nas leis, nos atos administrativos e nas decisões judiciais voluntaristas que se afastam do marco legal. “Essas decisões são influenciadas por fatores humanos, como o grave quadro de desigualdade no Brasil. Essas deliberações são influenciadas por ideologias, posicionamentos políticos, pressão da opinião pública e, por vezes, pela desconsideração do fato de que todo direito tem um custo. No exercício da magistratura, o maior desafio é equilibrar as necessidades dos trabalhadores com os limites dos empresários e do próprio governo na esfera econômica”, salientou Pastore.
Fonte: Contábeis